quinta-feira, 11 de maio de 2017

ENCONTRO - 100 ANOS DAS REVOLUÇÕES RUSSAS (1917 - 2017)




E N C O N T R O
1917-2017: 100 ANOS DAS REVOLUÇÕES RUSSAS

Datas: 12 à 14 de junho de 2017.
Local: Sala Manuel Correia, 3o andar do CFCH. UFPE, Recife.
Promoção: Departamento de História e Programa de Pós-Graduação em História e NUDOC da UFPE.

No ano do centenário das Revoluções Russas, nas quais as trabalhadoras e os trabalhadores tiveram um papel central definindo os rumos da primeira experiência socialista da História, serão revisitados esses acontecimentos que marcaram profundamente do século XX.

O Departamento de História e o NUDOC da UFPE, reconhecendo a importância destas revoluções, fruto de entusiasmo e de esperanças, propõem debates e trocas acadêmicas acerca deste momento histórico e seus desdobramentos em diferentes campos em termos de organização social, política, manifestações culturais etc.


12/06/2017 (2ª feira)
14h00 - Conferência de Abertura: Prof. Dr. Ivo Tonet (UFAL)

16h00 -  Mesa 1: As Revoluções Russas (Coord. Prof.  Ms Júlio Barros IFPE)
Palestrantes:
Profa. Dra. Socorro Abreu (UFPE),
Prof. Dr. Tiago Bernardon (UFPB),
Prof. Dr. Daniel Rodrigues (UFPE)


13/06/2017 (3ª feira)
GTs - 9h00 às 12h00

14h00 - Mesa 2: O movimento operário: 1917 no Brasil (Coord.Prof. Dr. Cristiano Christillino UEPB)
Palestrantes:
Prof. Dr. Osvaldo Maciel (UFAL),
Prof. Dr. José Bento Rosa da Silva (UFPE)

16h00 - Mesa 3: Arte e Revolução (Coord. Ms Elza Mendonça)
Palestrantes:
Prof. Dr. Lourival Holanda(UFPE)
OdomiroFonseca (Dr pela USP)
Leonardo Lacca (Cineasta autor do filme “Eisenstein”)


 14/06/2017 (4ª feira)
GTs - 09h00 às 12h00

14h00 - Mesa 4: Outras revoluções: Reforma Agrária no México (1917), Descolonizações na África (1957) e Movimento revolucionário na China (1919) (Coord. Ms Arthur Barros)
Palestrantes:
Prof. Dr. Sebastião Vargas (UFRN)
Profa. Dra. Luíza Nascimento dos Reis (UFPE)
Profa. Dra. Christine Dabat (UFPE)

16h00 - Conferência de encerramento: Profa. Dra. Socorro Ferraz (PPGH-UFPE)



GTs

1.     ENSINO DE HISTÓRIA: CURRÍCULO, MATERIAIS DIDÁTICOS E A HISTORIOGRAFIA ESCOLAR. (Profª. Drª. Juliana de Andrade- UFRPE).
2.     HISTÓRIA AMBIENTAL: O OCIDENTE E OS “OUTROS” (Ms. Raíssa Orestes).
3.     ESCRAVOS, LIBERTOS E HOMENS LIVRES POBRES NO BRASIL (Prof. Dr. Robson Costa e Profª. Dra. Valéria Costa).
4.     MUNDOS DO TRABALHO E O CENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO RUSSA: INFLUÊNCIAS, ORGANIZAÇÕES E LUTAS. (Ms. Izabel Helena Acioli Siqueira dos Santos e Ms. Thayana de Oliveira Santos)
5.     “NOVA HISTÓRIA POLÍTICA”: GOVERNOS, INSTITUIÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL REPUBLICANO (Prof. Ms. Arthur Victor e Prof. Ms. Júlio César Barros).
6.     HISTÓRIA DA ÁFRICA E DA DIÁSPORA AFRICANA. Prof. Dr. José Bento Rosa da Silva e Profª. Drª. Luiza Nascimento dos Reis).
7.     “Nos fronts da cidadania”:  AS REVOLUÇÕES NO COTIDIANO DAS MULHERES. (Ms.  Bruna Hanny Benning e Ms. Marcela Heráclio IFPE).
8.     HISTÓRIA POLÍTICA E SOCIAL NO PERÍODO IMPERIAL (Profª. Drª. Suzana Cavani e Prof. Dr. Cristiano Christillino).
9.     HISTÓRIA NA ÁSIA (Profª. Drª. Christine Dabat e Ms. Angélica Alencar).

GTs

ENSINO DE HISTÓRIA: CURRÍCULO, MATERIAIS DIDÁTICOS E A HISTORIOGRAFIA ESCOLAR

Profª. Drª. Juliana de Andrade
UFRPE

O presente simpósio temático tem como finalidade reunir pesquisadores e estudiosos do campo do ensino de História, que discutem questões relativas aos problemas do currículo de ensino de história na Educação Básica (Ensino Fundamental e Ensino Médio, os usos dos diferentes materiais didáticos nos espaços escolares e extraescolares e como a historiografia escolar tem discutido conceitos e temas norteadores para a História, como por exemplo, o conceito de revolução, escravidão, pobreza e etc. Nesse sentido, convidados a todos (as) os(as) interessados em  discutir as novas configurações do campo do ensino de história e o dialogo que estabelece com a teoria da história.



HISTÓRIA AMBIENTAL: O OCIDENTE E OS “OUTROS”

Raíssa Orestes Carneiro
Mestre em História pela UFPE

Ao longo de boa parte da história da humanidade e entre os mais variados povos, construiu-se, muitas vezes, uma relação ambígua com o ambiente. De um lado, sendo objeto de proteção, desde o Domesday Book, de Guilherme, o Conquistador, até as Conferências da ONU, passando pelos jardins botânicos europeus e pelos zapovedniksrussos; de outro, sendo visto, por razões diversas, como algo a ser combatido, em nome da “civilização”, o meio natural acabou sofrendo duros golpes e somente nos últimos anos começou a receber proteção pelo seu valor intrínseco. É, de fato, impossível pensar a existência do ser humano sem o seu entorno. Mas mudanças de atitude podem ser úteis e devem ser buscadas na alteridade, isto é, na percepção do outro. Diante disso, a proposta deste simpósio é a de estimular o debate a respeito das questões ambientais através da sua apreensão nos mais variados âmbitos de estudo (História, Direito, Geografia, Antropologia) e entre os diversos povos e contextos, considerando o ambiente nas suas múltiplas formas de abordagem.
   


ESCRAVOS, LIBERTOS E HOMENS LIVRES POBRES NO BRASIL

Prof. Dr. Robson Costa
IFPE, Campus Recife/PE

Profª. Dra. Valéria Costa
IF Sertão PE, Campus Serra Talhada/PE

Nas últimas décadas, os estudos sobre a escravidão no Brasil foram ampliados através de novas metodologias (a exemplo da Micro História) e novos olhares sobre as fontes e os sujeitos, influência advinda principalmente da Nova História Cultural e da História Social do Trabalho. O retorno aos arquivos, aos documentos, se revelou extremamente frutífera, contribuindo para romper com velhas explicações generalizantes que encobriam os indivíduos com estatísticas capazes de silenciar suas ações e reações às violentas engrenagens que visavam triturar qualquer indício de sua humanidade e capacidade de resistência. Partindo desta perspectiva, o objetivo deste GT é ampliar as lentes de observação sobre os mundos do trabalho, nas cercanias rural e urbana, trazendo à tona os diversos sujeitos históricos que eram parte integrante da sociedade escravista. Assim, estudiosos que desenvolvem pesquisas sobre os escravos, os libertos e/ou os chamados homens livres pobres (em suas mais diversas faces) terão espaço neste GT para apresentarem seus resultados e, com isso, enriquecer ainda mais os debates sobre as particularidades envolvendo as relações de trabalho e também as práticas culturais destes diferentes agentes históricos.  



MUNDOS DO TRABALHO E O CENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO RUSSA: INFLUÊNCIAS, ORGANIZAÇÕES E LUTAS


Izabel Helena Acioli Siqueira dos Santos
Mestre em História pela UFPE

Thayna de Oliveira Santos
Mestre em História pela UFPE
                                          
Os movimentos de trabalhadoras e trabalhadores tiveram um papel crucial na consolidação da democracia no Brasil e no mundo. Desta forma, este GT pretende reunir pesquisadores que se dediquem ao estudo dos mundos do trabalho. De acordo com Eric Hobsbawm, a história de qualquer classe não pode ser escrita de maneira isolada, seja de outras classes, dos Estados, de sua herança histórica e das transformações das economias que requerem o trabalhado assalariado e criaram e transformaram as classes que o executam.  No ano do centenário da Revolução Russa de 1917, quando os(as) trabalhadores(as) tiveram um papel central nos rumos daquela que se consolidou como a primeira experiência socialista da História, e tendo em vista os debates recentes acerca da centralidade ou não do trabalho no mundo contemporâneo, pretendemos construir um ambiente de debate e troca de experiências, tendo as classes trabalhadoras como principal ponto de partida, conforme propõe Eric Hobsbawm.



“NOVA HISTÓRIA POLÍTICA”: GOVERNOS, INSTITUIÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL REPUBLICANO

Prof. Ms. Arthur Victor
Mestre em História pela UFPE

Prof. Ms. Júlio César Barros
IFPE

A negação do aspecto político foi uma característica evidenciada em grande parte da produção historiográfica dos Annales. As críticas sobre a História Política recaíam, sobretudo, ao interesse demasiado pelas minorias privilegiadas e, por consequência, à negligência que era dada ao aspecto social. Assim, o estudo do político passou a ser relacionado a uma forma ultrapassada, e que deveria ser superada, de fazer história. As próprias críticas elaboradas pelos autores dos Annales e as contribuições de Michel Foucault e Pierre Bourdieu, por exemplo, que pensaram as relações de poder para muito além do Estado, foram importantes para sua renovação. Ao longo dos anos, novos objetos, novas fontes e novos atores sociais foram incorporados. Os reis, o Estado Nacional, os governantes, as classes dominantes etc. ganharam a companhia de movimentos sociais, de grupos de pressão, da mídia, etc., ampliando, assim, suas fronteiras de estudo. Nesta perspectiva, o exame aqui proposto busca reunir pesquisadores que desenvolvem suas pesquisas em torno da Nova História Política e tenham interesse, por exemplo, no papel das eleições e campanhas eleitorais; nos partidos políticos; nas associações políticas, tais como: ligas, federações e sindicatos; nas dimensões políticas da imprensa e da mídia; na organização e composição de governos; e nos grupos de pressão, organizados por órgãos patronais e movimentos sociais, sob os governos.



HISTÓRIA DA ÁFRICA E DA DIÁSPORA AFRICANA

Prof. Dr. José Bento Rosa da Silva
UFPE

Profª. Drª. Luiza Nascimento dos Reis
UFPE

Este Grupo de Trabalho[GT] visa reunir pesquisadores e estudantes vinculados com apesquisa e o ensino de História da África no sentido de promover o debate entretrabalhos voltados à História do continente africano e da Diáspora. Delimitamos um recorte cronológico que abrange os processos históricos africanosocorridos entre   o   século XIX   e   os   dias   atuais. O grupo de trabalho tem uma perspectiva interdisciplinar. Serão aceitos trabalhos acadêmicos concluídos ou em fase de desenvolvimento.



“Nos fronts da cidadania”: AS REVOLUÇÕES NO COTIDIANO DAS MULHERES
                                            
Ms. Bruna Hanny Benning
Mestre em História pela UFPE


Ms. Marcela Heráclito
Mestre em História pela UFPE
                                          
O nosso grupo de trabalho tem como objetivo reunir pesquisas que ofereçam discussões sobre as expressões das mulheres em favor de sua cidadania,  através de  combates no campo das ideias, de enfrentamentos diretos e/ou  por vias subterrâneas  ou através de contingências, nos espaços públicos e privados ocupados por elas. Com feição multidisciplinar, o GT “as revoluções no cotidiano das mulheres” tratará de temas  que fazem parte de seu cotidiano de vida tais como direitos reprodutivos, maternidade, relação com o corpo, prostituição,  equidade nas relações de trabalho e emprego, sufrágio, acesso à educação e demais equipamentos sociais.  Com o intuito de estimular o debate sobre porque a maioria das discussões, combates e enfrentamentos  travados  há tempos ainda permanecem no cotidiano das mulheres sem solução, pretendemos, no centenário das revoluções russas, convidar pesquisadoras e pesquisadores a pensar  a partir do exemplo destas revoluções, estratégias de superação precursoras de novos caminhos.



HISTÓRIA POLÍTICA E SOCIAL NO PERÍODO COLONIAL

Profª. Dra Suzana Cavani
UFPE

Prof. Dr. Cristiano Christillino Angélica Alencar
UEPB

Este Simpósio visa criar um espaço para o debate de questões relacionadas ao social, ao político, a partir de perspectivas teórico-metodológicas que focalizem as rupturas, as permanências, as simultaneidades, os antagonismos e as ambivalências historicamente tecidas pelas classes dominantes e as camadas populares, no Brasil durante o perído imperial.  As práticas, estratégias e cultura políticas e sua influência nas lutas dos agentes sociais se constituem em temáticas de interesse para discussão, bem como as estratégias de famílias na manutenção e ampliação do poder econômico e político.  Interessa-nos também o debate sobre instituições políticas e as formas materiais e simbólicas de lutas e/ou relações de poder direcionadas à construção/desconstrução, legitimação/deslegitimação de hegemonias ou dominações políticas, inscritas tanto no campo como na cidade ao longo de tempo.


A nossa proposta tem ainda por objetivo evidenciar e analisar a maneira pela qual ocorre a inserção da esfera micro na dimensão macro, as atualizações e ressignificações do local e do regional diante das injunções produzidas pela dinâmica do global, como também apreender os processos e as tramas que singularizam as histórias do local e regional e o espaço de negociação estabelecida pelos seus atores com os poderes instituídos nacionalmente.



HISTÓRIA NA ÁSIA

Profª. Dra Christine Dabat
UFPE

Ms. Angélica Alencar
Doutoranda na Universidade Sophia, Tokyo

Se a atualidade não deixa esquecer que, segundo a última obra de Pierre Grosser, “A história do mundo acontece na Ásia” (2017), pesquisadores interessados em aspectos de sociedades diversas, particularmente a China e o Japão, ao fio dos séculos, podem fornecer enfoques esclarecedores. O presente GT visa encorajar as trocas na comunidade acadêmica e suscitar vocações pela evocação da imensa riqueza deste campo disciplinar.

sábado, 6 de maio de 2017

Por que as revoluções não levaram à sociedade socialista?


Sérgio Lessa
A QUESTÃO É MAIOR DO QUE SUA APARÊNCIA
As revoluções são um fenômeno histórico para a humanidade. A primeira foi a Revolução Inglesa, entre 1642 e 1688. A segunda, mas a primeira com impacto mundial, foi a Revolução Francesa entre 1789-1815. O século 19 conheceu vários períodos revolucionários, o mais intenso deles foi o de 1848-52, quando pela primeira vez o proletariado e a burguesia entraram em um aberto conflito. Depois, viria a Comuna de Paris (1871).
Contudo, o maior e mais intenso período revolucionário da história é aquele que se inicia com a Revolução Russa de 1905 e se estende até o final da Revolução Chinesa (1949). Essa é uma fase da história em que há revoluções em todos os continentes, exceto a Oceania. Movimentos revolucionários – e mesmo revoluções – tiveram lugar em países mais avançados, com um proletariado significativo (Revolução Alemã, Espanhola, Greve de 1936 na França, resistência contra os nazistas no final da II Guerra Mundial) e em países muito menos desenvolvidos no sentido capitalista (como a China, a Índia e o Paquistão, o México); táticas e estratégias revolucionárias, as mais diversas, foram surgindo e se desenvolvendo segundo as necessidades de cada situação (stalinismo, maoísmo, autonomismo, titoísmo, trotskismo, leninismo, anarquismo etc.) – e também foi nesse período que conhecemos a primeira organização verdadeiramente mundial dos trabalhadores, a III Internacional ou Internacional Comunista. Contava com partidos em praticamente todos os países do mundo e, em vários deles, tinha os mais importantes partidos de base operária (França, Alemanha, por exemplo). Foi, ainda, esse período que assistiu ao amadurecimento ideológico e teórico da geração de revolucionários mais significativa da história, com Lenin, Rosa Luxemburgo, Trotsky, Bukharin, Preobrajensky, Radek, Riazanov e, também, da geração seguinte, marcada principalmente por Gramsci e Lukács. De todas as revoluções, a mais importante foi a Revolução Russa de 1917. Não apenas por ter sido a primeira com um vasto impacto em todo o planeta, mas também porque, em poucas décadas, elevou a URSS à segunda potência mundial.
A questão, portanto, é de uma importância enorme: por que foram derrotadas (no sentido de não abrirem a transição ao comunismo, através do socialismo) todas as revoluções do maior período revolucionário que a humanidade jamais conheceu, com uma geração de teóricos e dirigentes que até hoje não foi superada por nenhuma outra? Por que nenhuma das revoluções que colocaram os revolucionários no poder pôde superar o capital?
O REINADO DA CONFUSÃO
Os revolucionários que viveram esses anos foram sendo surpreendidos por inesperadas evoluções dos processos revolucionários em andamento. A previsão de Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburgo, etc. de que o poder revolucionário, na esfera da política, se caracterizaria pelo gradual, porém acelerado, desaparecimento do Estado, das classes sociais, da família monogâmica e dos países (tratamos disso em “O que é o socialismo?”), era sistematicamente negada. As revoluções davam, seguidamente, origem a Estados ainda mais poderosos do que o das velhas classes dominantes, seus exércitos eram ainda mais fortes e maiores, a distância entre os dirigentes e os trabalhadores não parava de aumentar, a repressão política e a polícia política jogavam um papel cada vez mais importante na vida social.
Na esfera da produção, as coisas não caminhavam muito melhor: a propriedade individual foi substituída pela propriedade estatal, originando um gigantesco e poderoso aparato, unificado nacionalmente, com a força policial e política do Estado a lhe dar respaldo, de controle sobre os trabalhadores. O trabalho proletário que – como vimos em “O que é socialismo?” – funda o modo de produção capitalista, não apenas não era naqueles processos superados pelo trabalho associado, como ainda se expandia e passava a imperar em toda a esfera produtiva. Uma férrea ditadura, tanto na esfera da política quanto da produção, se contrapunha dolorosamente ao reino da liberdade e da pronta redução da jornada de trabalho propostas por Marx e Engels.
Ao mesmo tempo, pelos mesmos processos, os países que fizeram suas revoluções conheceram um acelerado desenvolvimento das forças produtivas, com uma não menos acelerada redução da miséria secular de seus povos. Poucas décadas depois das revoluções, as condições de vida e trabalho da vasta maioria dos soviéticos, chineses etc. haviam melhorado de forma muito significativa. Educação pública e universal, assistência médica para todos, casa e trabalho para todos etc. eram realizações efetivas. O apoio dos trabalhadores aos governos revolucionários – mesmo sendo ditatoriais e opressivos – era muito grande. Stálin era adorado pelos trabalhadores soviéticos, o mesmo ocorrendo com Mao-Tse-Tung na China. A consolidação do stalinismo, do maoísmo, do titoísmo etc. são fenômenos ideológicos que têm suas bases sociais na incrível melhoria das condições de vida e trabalho das massas de trabalhadores de seus respectivos países.
Essa foi a situação histórica que inaugurou uma enorme confusão entre os revolucionários.
Por um lado, convertendo necessidade em virtude, uma parcela dos revolucionários passou a defender que as teses de Marx e Engels eram utópicas (no sentido de não terem lugar na história) e que a vida estaria mostrando que o verdadeiro socialismo, “socialismo real”, era o que estava sendo construído naqueles dias na URSS (ou, a depender a filiação político-partidária, na República Popular da China, ou no Vietnam, ou na Albânia, e assim por diante). Em todas essas variantes, aceitava-se que o socialismo seria um Estado ditatorial, com um gigantesco aparato de controle policial e político dos trabalhadores. Aceitavam, ainda, que o socialismo não superaria o mercado e o trabalho proletário – pelo contrário, estes seriam essenciais “ao socialismo real”!
O campo do “socialismo real” não era, de modo algum, homogêneo: stalinistas criticavam os maoístas, estes criticavam os titoístas, todos combatiam os trotskistas, estes últimos criticavam de volta a todos os outros… mas, em todas as críticas aceitava-se como socialistas o mercado, o Estado, o trabalho proletário, a repressão sobre os trabalhadores e proletários. O que estaria errado – nisso também todos coincidiam – seria, apenas e tão somente, a direção política. Se Trotsky – e não Stálin – houvesse permanecido no poder na URSS, o socialismo teria sido lá construído, argumentavam os trotskistas. Se os stalinistas e não os maoístas tivessem vencido a luta interna no PC Chinês, a revolução naquele país teria sido socialista – diziam os stalinistas sobre a China, enquanto o PC Chinês garantia que se os maoístas estivessem no poder na URSS, esta não teria degenerado em um “Estado burocrático”. A questão, no fundo, para todo esse campo, centrava-se na direção política. Dependendo da preferência política, a direção “correta” seria o stalinismo, o maoísmo, o trotskismo, o titoísmo e, logo depois, o castrismo, o guevarismo etc., etc. e, já mais bem para frente, nos anos 1980, o eurocomunismo.
Além do campo do “socialismo real”, abriu-se outro campo mais amplo e ainda mais heterogêneo, que afirmava que a ordem surgida das revoluções seria, na verdade, a traição dos ideais revolucionários. Já nos anos de 1920 esse campo começou a se delinear com a Oposição Operária na Rússia e, depois, com as críticas à nascente ordem soviética pelos autonomistas e anarquistas. Com o passar do tempo, muitos intelectuais e organizações políticas foram se aproximando ou aderindo a essa concepção: as sociedades saídas dos processos revolucionários nem eram socialistas, nem estavam a caminho de se converterem em socialistas. Uma parte desse campo migrou para a direita: a democracia burguesa seria a melhor opção para a humanidade e, pela adoração à democracia, essa porção aderiu ao campo da contrarrevolução. A Escola de Frankfurt, com Adorno e Habermas, foi o exemplo mais típico dessa evolução, mas longe de ser o único. Uma outra parte permaneceu à esquerda: as concepções políticas autoritárias – que, argumenta-se, já estariam presentes em O que fazer? de Lenin, com a concepção do partido centralizado que traria “de fora” da classe a consciência revolucionária – seriam a causa principal da degenerescência do poder revolucionário em ditaduras contra os trabalhadores. Suas expressões mais importantes foram os luxemburguistas e os autonomistas: o problema decisivo teria sido, segundo eles, a liquidação da autonomia dos trabalhadores nos anos de 1919-1920 na antiga Rússia. Os principais responsáveis pelas derrotas seriam os bolcheviques, os leninistas de todos os tipos.
A confusão estava posta: a questão da direção política (e, portanto, da concepção político-ideológica dos dirigentes) seria o que decidiria se uma revolução superaria (ou não), pelo socialismo, a ordem burguesa. No fundo, a verdade dependia da escolha pessoal de cada revolucionário: se optasse pelo maoísmo, os traidores seriam os stalinistas, trotskistas, autonomistas etc. Se fosse um stalinista, os traidores seriam os trotskistas, os maoístas, os autonomistas etc. Se fosse um anarquista, os culpados seriam os leninistas, stalinistas, trotskistas – e assim sucessivamente.
Quando a escolha pessoal passa a ter tal importância, a confusão está instalada: não há argumentos que seja superior a outro, a opinião de cada um é o critério da verdade. Esse é um claro sinal de que a teoria não está dando conta de acompanhar a história.
MÉSZÁROS E PARA ALÉM DO CAPITAL
Esse reino da confusão começaria a ser superado com a publicação, por Mészáros, na Inglaterra, em 1944, de sua obra-prima, Para além do capital. Este foi o primeiro – e até hoje único – estudo aprofundado sobre as condições de reprodução do capital no século 20. Em se tratando o nosso tema, Mészáros assinala que as revoluções do século 20 ainda podiam desenvolver – e desenvolveram de forma muito rápida – as forças produtivas em escala nacional. A produção poderia ser enormemente ampliada, o desemprego podia ser eficientemente administrado, as condições de vida e trabalho da população poderiam ser muitíssimo melhoradas, pela exploração dos trabalhadores por meio de um Estado que concentrasse a propriedade e que planejasse toda a produção.
A intensa e rígida repressão dos trabalhadores e proletários correspondia às condições de exploração dos trabalhadores que se faziam imprescindíveis. Muito rapidamente, nas “sociedades pós-revolucionárias” tivemos o surgimento de uma nova modalidade da exploração dos trabalhadores pelo capital. Nova, porque tem no Estado o proprietário dos meios de produção. Mas, ainda assim, mantém a exploração dos trabalhadores e proletários pelo assalariamento.
A exploração dos trabalhadores e proletários pelo assalariamento é, precisa e exatamente, o capital. O trabalho que produz o capital – como vimos em “O que são classes sociais?” – é o trabalho proletário.
Lembremos que o capital é a relação social pela qual se extrai o trabalho excedente pela redução da força de trabalho a uma mercadoria e o assalariamento é a sua a expressão cotidiana. As revoluções da primeira metade do século 20, afirma Mészáros, deram origem a países que se estruturam ao redor da exploração do homem pelo homem (com tudo que a acompanha: o Estado, a família monogâmica, as classes sociais e as desumanidades que têm sua origem no capital); foram revoluções nacionais e que cumpriram o papel de desenvolver muito rapidamente as forças produtivas do capital em países muito atrasados, como a Rússia e a China. Tais revoluções – nacionais e em países pouco desenvolvidos – não podiam iniciar a transição ao comunismo pela passagem do trabalho proletário ao trabalho associado.
Todavia, por que isso ocorreu? Por que nas “sociedades pós-revolucionárias” não se superou o capital? A possibilidade de uma explicação veio de uma profunda mudança no modo de produção capitalista, o início da crise estrutural do capital, na década de 1970.
A CRISE ESTRUTURAL
Vimos, em “O que é o socialismo?”, como, com a Revolução Industrial (1776-1830), a capacidade produtiva ultrapassa as necessidades humanas e gera uma abundância que, para o capitalismo, não passa de superprodução. Isto é, a oferta de mercadorias é maior do que a procura e, consequentemente, os preços tendem a cair conforme aumenta a produção, conduzindo às crises cíclicas. Na década de 1970, a abundância se tornou tão intensa (dado o desenvolvimento da produção) que nem sequer a crise foi capaz de superar a superprodução. Para sobreviverem, as empresas precisaram demitir trabalhadores e aumentar a produção: essa é a dinâmica de uma crise infindável, pois, a cada aumento da produção com o aumento correspondente do desemprego, se intensifica a contradição fundamental: uma crescente produção para um mercado que se reduz pelo aumento do desemprego. Em 1970 a abundância torna-se permanente e tem início a crise estrutural do sistema do capital em seu todo.
A crise estrutural bloqueia a via do desenvolvimento das forças produtivas nacionais pela propriedade estatal dos meios de produção, por um sistema político ditatorial e através da exploração dos proletários e trabalhadores. Isso porque o capital em crise estrutural necessita, imediata e diretamente, de toda mais-valia produzida no planeta e nada mais sobra para desenvolver – como fizeram a Rússia, a China etc. – as forças produtivas locais.
É essa necessidade absoluta do capital por todo átomo de mais-valia que conseguiu extrair dos trabalhadores e proletários um dos fatores decisivos para a atual “integração” da Rússia e da China, do Vietnam e de Cuba, ao mercado mundial. É essa mesma necessidade que inviabiliza que novas revoluções sigam a “via” chinesa, ou soviética, ou cubana etc.
O sistema do capital, nesse período de sua crise estrutural, se converteu em uma totalidade mundial de tal forma articulada que as revoluções apenas podem sobreviver se confrontarem o capital como um todo. Por isso, as revoluções que vierem a acontecer terão, muito rapidamente, de se desenvolver até o socialismo ou perecerão frente à contrarrevolução: já não existe mais o meio termo de os revolucionários se manterem no poder pela via do desenvolvimento, sob o capital, das forças produtivas em escala nacional pela exploração do trabalho proletário.
Por que, então, todas as revoluções foram derrotadas? Porque ocorreram em um período histórico, antes de 1970, em que ainda era possível o desenvolvimento das forças produtivas do capital em países isolados e economicamente atrasados. Por isso nem puderam se internacionalizar, nem puderam abrir a transição ao comunismo. Isolados no poder, os revolucionários tiveram apenas a alternativa de desenvolver a força produtiva do capital: as “sociedades pós-revolucionárias”, que faziam parte do sistema mundial do capital. Não lhes restava alternativa: havia que substituir as velhas formas de trabalho da Rússia czarista, da China Imperial etc. pelo trabalho proletário. Houve uma vasta melhoria nas condições de vida dos trabalhadores, mas isso estava longe de dar início ao socialismo.
Em nossos dias, não há razão para qualquer confusão. Descoberta a principal razão histórica de todas as revoluções do século 20 não terem conduzido ao socialismo e ao comunismo, torna-se possível uma avaliação científica, histórica, dos processos revolucionários que supere as opiniões e preferências pessoais. Os acertos e os erros do passado, suas variadas expressões ideológicas, as não menos diferentes tentativas de explicação teórica etc. podem, agora, ser compreendidos a partir de sua base social: tornou-se, finalmente, possível uma compreensão que forneça elementos para o desenvolvimento da teoria revolucionária. Essa é parte da enorme contribuição de Mészáros ao movimento revolucionário.
Por outro lado, as revoluções que vierem a ocorrer confrontarão o sistema do capital como uma unidade: ou destruirão o capital ou serão por ele derrotadas. Serão revoluções que, mesmo se iniciando em países, se internacionalizarão rapidamente – ou perecerão não menos rapidamente. Contarão com uma possibilidade que não existia antes da crise estrutural, qual seja, a possibilidade do desenvolvimento das forças produtivas em escala planetária – para além do trabalho explorado por meio do assalariamento (o trabalho proletário), para além do mercado.
Essa possibilidade, nova, que abre as portas para a transição ao comunismo pela mediação do socialismo, não existia antes da crise estrutural: por isso, todas as revoluções do mais incrível período revolucionário da história foram derrotadas – no sentido de não inaugurarem a transição para além do capital.

O que é o Socialismo

Sérgio Lessa


Duas dificuldades

A resposta a essa questão enfrenta dois problemas. O primeiro se relaciona ao fato de que o desenvolvimento da humanidade, com frequência, cria possibilidades novas, antes inexistentes, que fazem com que a imaginação do que seria o seu futuro seja, quase sempre, uma tarefa inútil. Marx e Engels recusaram todo futurologismo, isto é, dizer como seria uma sociedade em que não houvesse a exploração do homem pelo homem. Essa a primeira dificuldade: não é possível afirmar com precisão aquilo que os seres humanos poderão fazer no futuro.
A segunda dificuldade diz respeito ao próprio socialismo.
Escravismo, feudalismo e capitalismo, nós sabemos o que são. São as formas de organização social que se baseiam nas formas típicas do trabalho explorado (do trabalho alienado). O trabalho escravo é a base do modo de produção escravista, o trabalho do servo é o alicerce do feudalismo e, o trabalho proletário, do capitalismo1.
Comunismo – ainda que nunca o tenhamos conhecido – também tem uma definição clara, precisa: é o modo de produção que tem por base o trabalho associado (ou seja, não alienado, não explorado). Por não ter por base a exploração do homem pelo homem, o comunismo será uma forma de organização social sem Estado, propriedade privada, classes sociais ou família monogâmica (trataremos do comunismo no próximo Jornal Espaço Socialista).
Socialismo, contudo, é algo diferente. O socialismo é a etapa histórica de transição entre o modo de produção capitalista e o modo de produção comunista. Suas características dependerão, portanto, de onde se iniciar a transição. Em uma sociedade mais desenvolvida, as tarefas imediatas da transição serão muito diferentes das de uma sociedade mais atrasada. Dependendo do patamar do desenvolvimento das forças produtivas, a humanidade pode ter problemas, desafios e possibilidades muito diferentes para a transição do capitalismo ao comunismo.
Por isso, ao contrário do capitalismo, do feudalismo, do escravismo e do comunismo, o socialismo só pode ser definido como uma transição. Diferente do capitalismo que tem em sua base o trabalho proletário, do feudalismo que se alicerça no trabalho servil, do modo de produção escravista, que se baseia no trabalho escravo, o socialismo é a passagem do trabalho proletário ao trabalho associado, da sociedade capitalista à sociedade comunista. Não há um modo específico de trabalho (como o trabalho escravo, o proletário, etc.) que seja a base do socialismo. Nesse preciso sentido, o socialismo não é um modo de produção, mas a passagem do modo de produção capitalista ao modo de produção comunista.
Dentro de limites – portanto, sem futurologismo e sem perdermos de vista o seu caráter passageiro, transitório – é possível dar uma resposta à questão sobre o que é o socialismo.

A resposta

Marx e Engels conheceram apenas uma experiência revolucionária que deu os primeiros passos dessa transição: a Comuna de Paris, de 1871. Os trabalhadores formaram, por 73 dias, um governo próprio – e a forma dessa organização serviu para as primeiras análises sobre a transição. Nós conhecemos, no século 20, várias experiências revolucionárias (Revolução Russa, Revolução Chinesa, Guerra Civil Espanhola, etc.), que também, cada uma a seu modo, com suas diferenças, serve de exemplos para nosso estudo. Os processos revolucionários e os primeiros momentos da consolidação do novo poder fornecem indícios interessantes para respondermos a questão sobre o socialismo, já que alguns elementos estiveram sempre presentes:
1) a tomada do poder pelos trabalhadores tem sido, sempre, o resultado de uma intensa luta contra os exploradores. Nessa luta, as forças armadas, a polícia, o Estado, a burocracia e todos os instrumentos que servem para manter os trabalhadores sendo explorados pelos capitalistas começam a se dissolver, até desaparecerem quase completamente. No interior das fábricas e das fazendas, proletários e camponeses tomam o poder e começam a organizar, eles próprios, a produção. A dissolução do velho poder é causada pela pressão das massas revolucionárias, pelos embates e pela violência que é inerente a todas as revoluções.
No ano de 1917, na Rússia, o exército e a política, a burocracia estatal e o governo foram perdendo forças e sendo substituídos pela auto-organização dos trabalhadores e soldados. Eles criaram uma forma nova de organização do poder militar e político, o soviet (conselho). O soviet era muito parecido a como os trabalhadores organizaram seu autogoverno na Comuna de Paris, quase 50 anos antes.
A mais visível característica do socialismo é a destruição do velho Estado da classe dominante, a dissolução de todos os instrumentos que serviam para dominar os trabalhadores e sua substituição por uma nova forma de poder.
2) A nova forma de governo é a auto-organização dos trabalhadores. Para dar conta das tarefas de transição ao comunismo, nas experiências que conhecemos, essa nova forma sempre assumiu algumas características:
- termina a separação entre o legislativo e o executivo, típico dos governos burgueses. Agora, o mesmo corpo que toma as decisões também as leva à prática, os acertos e os erros podem ser rapidamente aproveitados ou corrigidos, conforme o caso.
- os representantes dos trabalhadores são, mesmo, “representantes”. Ou seja, são eleitos para cumprirem determinadas tarefas por um período limitado de tempo e, se não corresponderem aos que representam ou se não forem capaz de cumprir as tarefas, podem ser substituídos por um novo representante também indicado pela base – autonomamente, sem qualquer autorização ou controle de qualquer instância que seja.
- os representantes não podem ser sempre os mesmos, há rotatividade.
- o salário de um representante é o mesmo que de um trabalhador.
3) a repressão social fica a cargo dos trabalhadores em armas. Não haverá mais um exército profissional, policiais, carcereiros etc., os próprios trabalhadores, em armas, organizarão as formas que ainda forem necessárias de repressão. Sendo um governo e uma força pública armada dos trabalhadores, a repressão será contra as forças da contrarrevolução e, não, sobre os trabalhadores. Milícia, no dizer da Comuna de Paris, não mais um exército e polícia como é na ordem burguesa.
4) Um governo formado por representantes dos trabalhadores (que podem ser removidos a qualquer momento pela base, lembremos), uma milícia composta pelos trabalhadores em armas são iniciativas que se articulam com a organização da vida social em novas bases. Como será organizada a produção em cada fábrica, em cada cidade ou como será organizada a Educação em cada bairro, como serão criadas as crianças menores, como será o abastecimento de água, energia elétrica, etc. – são questões, entre muitas outras, que serão decididas pelas pessoas e comunidades diretamente envolvidas. A autonomia dos indivíduos e a autonomia das comunidades locais são condições para a cooperação voluntária e consciente de todos os indivíduos que compõem a humanidade.

O trabalho associado

Todavia, essas profundas e importantes inovações que a revolução traz para a organização política e social não são suficientes para conduzir o processo de transição ao comunismo, porque se limitam às esferas da política e da vida social. Se essas inovações não forem, ao mesmo tempo, acompanhadas pela substituição crescente pelo trabalho associado do trabalho proletário (isto é, o trabalho explorado do modo de produção capitalista), o capital voltará a dominar a sociedade mais cedo ou mais tarde. A consolidação e o avanço político e social que a revolução traz não podem se consolidar e avançar para o comunismo se não houver a substituição do trabalho proletariado pelo trabalho associado em um espaço de tempo não muito longo. Temos, com isso, a quinta característica importante do socialismo: o revolucionamento da produção pela entrada do trabalho associado.
O trabalho associado apenas pode existir em condições sociais muito específicas: a capacidade produtiva deve ser muito maior do que todas as necessidades de todos os indivíduos que compõem a humanidade. Marx e Engels calculavam que, em seus dias, se todos os indivíduos capazes trabalhassem, seria preciso uma jornada de 40 horas por semana para produzir tudo o que a humanidade necessitava. Hoje, precisaríamos trabalhar poucos minutos por dia2.
Esse é o significado da abundância: no modo de produção capitalista, para que os lucros sejam os mais elevados, aqueles que trabalham precisam cumprir jornadas de 8 ou mais horas por dia, enquanto uma enorme parte dos trabalhadores é condenada ao desemprego. No socialismo, pelo contrário, precisaríamos trabalhar ridiculamente pouco para produzirmos o que necessitamos.
Na esfera da produção, a primeira tarefa do socialismo é trazer todos para trabalhar. Não apenas os desempregados, mas TODOS. Isso significa que passarão a trabalhar todos aqueles que exerciam atividades como a polícia, o exército (que deixaram de existir), o funcionalismo público, os empregados nos sistemas administrativos das empresas, etc. A jornada de trabalho deve ser rapidamente reduzida de forma significativa – devendo se reduzir cada vez mais conforme se avança para o comunismo.
Como todos estarão produzindo para o consumo de todos, como se trabalha muito menos horas e consome-se muito mais do que na velha ordem burguesa, o interesse comum passa a ser a mais eficiente colaboração de todos com todos. Quanto melhor a colaboração, todos trabalham menos e, ainda, podem consumir, assim o desejando, ainda mais. A colaboração (não mais a concorrência) passa a ser a necessidade cotidiana de todos. A organização da produção vai deixando de ser a organização e controle das pessoas para se concentrar na administração das coisas e dos processos de produção: algo muito mais simples e que não requer todos os mecanismos de controle da produção capitalista.
Necessitando-se de um menor controle precisam-se de menos pessoas a ele dedicadas: mais gente pode ser deslocada para a produção, com isso a jornada de trabalho pode ser ainda menor e assim sucessivamente. A economia passa a funcionar por outro critério: ao invés do lucro, o “tempo disponível” para todos viverem a vida que desejarem. Quanto menos tempo necessário de trabalho, maior o “tempo disponível”.
O trabalho no socialismo deixa de ser exercido pelo controle da classe dominante sobre os trabalhadores e passa a ser a colaboração livre, voluntária e consciente de todos os seres humanos com a finalidade de produzirem o que necessitam. Isto é o trabalho associado.
A substituição, a mais rápida praticável, do trabalho proletário pelo trabalho associado é o que caracteriza o socialismo do ponto de vista da produção: como vimos, esta é sua quinta característica, ao lado da substituição do Estado pela Comuna ou Soviet, a substituição do exército e da política pela milícia dos trabalhadores em armas, a criação de um governo com representantes que podem ser removidos a qualquer momento pela base e que recebem o mesmo salário dos trabalhadores e, por fim, a auto-organização e autonomia dos trabalhadores em todas as esferas, mas principalmente na produção.
Tudo isso nos conduz à sexta característica do socialismo: a Internacional

A Internacional

A humanidade hoje se organiza em países. Os países são, se bem analisados, nada mais do que um território dominado por um Estado que é a expressão política do domínio de uma classe exploradora sobre os trabalhadores. O que hoje se chama de nação ou de país – e o patriotismo que faz parte de sua ideologia – nada mais são do que a expressão, em nossos dias, do domínio da burguesia sobre o proletariado em um território determinado.
No mundo que conhecemos, a concorrência existente entre as classes dominantes se expressa na concorrência, que leva à guerra, entre os países. A cooperação de todos os trabalhadores, de todos os países vai eliminar a concorrência e a oposição entre as nações que hoje conhecemos. Apenas será possível reduzir a jornada de trabalho de forma significativa se a cooperação entre os trabalhadores dos, hoje, distintos países for se tornando cada vez mais forte e intensa. Uma cooperação internacional dará origem a uma organização mundial dos trabalhadores.
Daqui a sexta característica importante do socialismo: não haverá mais países e fronteiras como hoje conhecemos. Todos os humanos serão cada vez mais (lembremos: o socialismo é um processo de transição ao comunismo) trabalhadores associados e, cada vez mais, a cooperação internacional imporá uma organização internacional da produção. Esse governo internacional dos trabalhadores é o que o movimento revolucionário clássico (isto é, da época de Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburgo, etc.) denominava de a Internacional. A criação e fortalecimento da Internacional, o governo mundial dos trabalhadores é a sexta característica importante do socialismo.
Socialismo e Comunismo
Frente ao capitalismo, o socialismo é quase um paraíso que parece impossível de ser atingido.
Trabalhar um ou mais dias por semana, ter acesso a todos os bens produzidos pela humanidade, participar das decisões e do poder todos os que trabalham é, para nossos dias, um paraíso quase inimaginável (lembremos, o velho Estado será substituído pela milícia dos trabalhadores em armas e pela auto-organização dos trabalhadores).
Todavia, ainda não é o comunismo. O socialismo, por ser uma fase de transição, ainda contém restos do velho passado. A classe dominante, enquanto existir tentará sabotar a produção, inviabilizar o socialismo e para impedi-la a milícia dos trabalhadores em armas é imprescindível. Apenas pela força pode-se impedir a contrarrevolução: pois é sempre pela força que a contrarrevolução tenta impor novamente a exploração dos trabalhadores.
Nesse período de transição, ainda haverá a luta de classes e, por isso, a milícia dos trabalhadores em armas é tão decisiva, repetimos. Ainda que seja a repressão da enorme maioria da população contra a minoria, ainda assim é uma situação histórica em que a força ainda decide para onde vai a humanidade. No socialismo a sociedade é muito mais “democrática” que qualquer democracia burguesa, pois é a maioria que reprime a minoria, não o inverso. Mas ainda é a força e a violência, como dizia Marx e Engels, a “parteira da história”.
Por isso, Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburgo entre muitos denominaram de Ditadura do Proletariado o novo governo revolucionário. Ditadura porque – sem a hipocrisia da ideologia burguesa – assume-se abertamente a repressão sobre os contrarrevolucionários. E proletária porque irá desaparecer tão logo as classes sociais tenham desaparecido, com a transformação de todos em trabalhadores.
O máximo da justiça que teremos no período socialista será o de “igual remuneração para trabalho igual”. Quem trabalha tem acesso aos bens produzidos na proporção em que contribuir para a produção. Frente ao mundo burguês, é um enorme avanço: mas, ainda, é essencialmente injusto. Os indivíduos humanos são diferentes entre si, suas necessidades pessoais e sua capacidade de produção individual não são as mesmas. Tratar os indivíduos como iguais (um enorme progresso frente à “justiça” burguesa) é, no fundo, uma vasta injustiça. No comunismo, teremos um critério verdadeiramente justo: “a cada um, de acordo com sua necessidade; de cada um, de acordo com sua capacidade”.

Conclusão

O socialismo, portanto, é a finalidade primeira de todo movimento revolucionário. Derrubar a ordem burguesa e implantar o socialismo significa abrir a transição para o modo de produção comunista. Mas é apenas a finalidade primeira: o real objetivo dos revolucionários é o comunismo. E há uma razão básica para ser assim: se o trabalho proletário, portanto, explorado, não for superado completamente pelo trabalho associado, os problemas históricos que hoje a humanidade enfrenta não poderão ser solucionados e, ainda, as enormes possibilidades de desenvolvimento que temos hoje não poderão ser aproveitadas. Em poucas palavras: o poder do capital retorna e as misérias do trabalho proletário voltam a ordenar a vida social.
O comunismo é claramente definido: um modo de produção fundado no trabalho associado, sem exploração do homem pelo homem, sem propriedade privada, sem Estado e sem patriarcalismo (sem família monogâmica). O socialismo é a transição histórica do capitalismo ao comunismo. As principais tarefas dessa transição: ir substituindo o trabalho proletário pelo trabalho associado; destruir o velho Estado e o substituir pelo autogoverno dos trabalhadores, criar e fortalecer a Internacional. Essa é a tarefa histórica imediata dos revolucionários em nossos dias.

Indicações para leitura:

O texto mais interessante para se iniciar o estudo é de Lenin, O Estado e a Revolução. De Marx, três textos são esclarecedores: As lutas de classe na França, em que analisa a Comuna de Paris, a Crítica ao Programa de Gotha e, com Engels, O manifesto comunista. De Engels, muito útil é Do socialismo utópico e científico – mas devemos desconsiderar seu entusiasmo pela estatização dos meios de produção, um entusiasmo que a história não confirmou. De Ivo Tonet, Sobre o socialismo (Instituto Lukács) é o melhor texto produzido entre nós.

fonte: http://espacosocialista.org/portal/?p=3938


Greve geral: é possível derrotar Temer e as reformas do Capital



Como já dissemos, Temer é um governo que existe para defender o capital. É um funcionário da burguesia. Quando implementa as reformas atende aos interesses de seus amos, dos capitalistas.
Mas, agora, a classe trabalhadora está se mobilizando e nas ruas.

A maior mobilização da classe trabalhadora desde o começo dos anos 90

Dia 28 de abril o Brasil parou contra as reformas do capital. Estima-se que 40 milhões de trabalhadores e trabalhadoras paralisaram as atividades. Foram realizadas manifestações de ruas reunindo milhares de pessoas.
Também ocorreram atividades de trancamentos de avenidas e rodovias, piquetes em frente a garagens, comércio, entre tantas outras atividades de construção da greve geral.
Uma presença importante nessa Greve Geral foi da juventude construindo esse momento nas escolas, universidades e participando das atividades de piquetes. A unidade entre estudantes e trabalhadores em ação direta foi fundamental para construir essa luta e também fortalecer as futuras gerações.
A última Greve Geral realizada pela classe trabalhadora brasileira foi em 1989. Dois dias, nas principais cidades brasileiras, com paralisação de fábricas, bancos, comércios, transportes e várias outras categorias.

Uma nova conjuntura

Desde as manifestações de 8, 15 e 31 de março entramos em uma outra conjuntura (aspectos mais imediatos da luta de classe) marcada pelo início da resistência da classe trabalhadora.
Com a paralisação da produção e as ruas sendo tomadas há um encorajamento do conjunto da classe que faz aumentar as lutas. Mas, isso não nos levar a um ufanismo, pois ainda atravessamos uma situação política (elementos mais estruturais, profundos da luta de classes) marcada pelos ataques aos direitos sociais e trabalhistas.
Temer e os parlamentares da base governista já declararam a continuidade da votação das reformas, ou seja, há muita luta pela frente.
O elemento mais importante dessa conjuntura é que está apresentada a possibilidade de derrotarmos as reformas. Ainda que isso seja muito difícil, pois elas são fundamentais para Temer e, principalmente, para garantir a lucratividade do capital.

Diferente de 2013, agora é a classe trabalhadora organizada

As mobilizações de 2013 eram de milhões de pessoas e foi um momento político muito importante, mas não tivemos a participação da classe trabalhadora de forma organizada. Os trabalhadores que participaram apresentavam-se na condição de indivíduo e não como categoria profissional organizada ou classe.
Dessa vez é diferente. Categorias votam em assembleias a participação na Greve Geral, os piquetes realizados, a construção de comitês de base nos bairros e cidades, enfim, todas essas atividades serviram para dar um caráter militante à Greve Geral.
A participação da classe trabalhadora organizada para a greve é fundamental porque interfere diretamente na produção e na circulação de mercadorias, atingindo diretamente o coração do capital.

A saída não é Lula

PT e Lula têm tentado “se apropriar” desse movimento e com isso fortalecer a candidatura de Lula em 2018 ou mesmo se houver a antecipação das eleições (como é o caso de propostas que tramitam no Congresso Nacional para que aconteçam as eleições em outubro desse ano).
A unidade com os diversos setores do movimento social, sindical, estudantil e popular é fundamental para fortalecer a luta. Nenhum setor da esquerda tem condição de levar essa luta sozinho. Mas, essa unidade não pode significar qualquer apoio ou compromisso com o projeto petista de canalizar a luta para as eleições, pelo contrário, é fundamental demarcarmos nossa oposição a essa saída.
Lula e Dilma, agora na oposição ao governo, querem que esqueçamos as reformas e as várias medidas contra os direitos da classe trabalhadora realizadas por eles. O PT é um partido, há muito, comprometido com o capital e continua nesse caminho de braços dados.

A importância da greve geral

A greve é o momento em que a classe trabalhadora toma em suas mãos o seu destino. Decide o que e como fazer: arrastão, assembleia, atividade cultural, enfim, não é o patrão quem manda. É um dos poucos momentos de liberdade que temos na sociedade capitalista.
E quando falamos de Greve Geral é ainda mais importante, pois é quando a classe trabalhadora mostra à toda sociedade que sem ela nada funciona. De que adianta prédio, máquina, ônibus, trem, lojas se não tiver o trabalhador e a trabalhadora? Capital não se reproduz.
É por isso que a burguesia e os governos tremem quando tem Greve Geral, pois se trabalhadores e trabalhadoras entenderem essa relação vão perceber o tamanho de sua força no mundo.

Seguir lutando até derrotar as reformas do capital

O tamanho e a importância da Greve Geral, de 28 de abril, devem ser realçadas, mas somente esse dia ainda não é suficiente para derrotar Temer e as reformas. É preciso dar continuidade a essa luta, com a realização de outras manifestações, atos e greves gerais de mais dias.
A construção de uma nova Greve Geral com mais força torna-se decisivo para levar Temer ao nocaute. Enfim, temos um longo caminho pela frente.
Outra questão importante para a continuidade da luta é a construção e o fortalecimento de comitês de base contra as reformas e para preparar novas ações da luta.
Esses comitês cumpriram um papel importante na explicação do significado da reforma com a realização de palestras, panfletagens nas fábricas, agitações nas praças, ônibus, trens, etc.
A organização desses comitês também pode contribuir para a construção da unidade da esquerda nas lutas e do fortalecimento da pressão sobre as direções sindicais burocráticas que querem se aproveitar da força do movimento para negociar pontos da Reformas, mudando apenas uma questão aqui ou outra ali. Para nós não deve haver nenhuma negociação com o governo e os patrões, somente o arquivamento dos projetos derrotará de vez as reformas.
Fonte: http://espacosocialista.org/portal/?p=5067

ALGUMAS LIÇÕES A PARTIR DA CONJUNTURA ATUAL

                                                              Por Ivo Tonet Introdução Como se pode ver, inúmeras e importan...